segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Questões sobre o livro 1984 de George Orwell


O tempo.

O tempo relatado efetivamente por Orwell não é o futuro nem o presente, mas sim o passado. É a relação do ser humano representado por Winston, com o próprio passado que dá conteúdo ao romance. Um protagonista sem passado em um drama contextualizado em um tempo e um espaço. É esse o desespero de Winston conhecer o seu passado. Mas, como afirma um dos slogans do Partido: quem controla o passado controla o futuro. Quem controla o presente controla o passado.

História.

Contextualizando o autor, o livro relata os regimes totalitários dos grandes ditadores da época de Orwell: Hitler, Mussolini e Stalin. Qualquer um deles se enquadraria no perfil do Grande Irmão ou ainda uma mistura de todos eles, pegando de cada um o que melhor os garantiu enquanto ditadores, afinal, nunca se viu o Big Brother e, sendo um computador, pode juntar a maior qualidade de cada um destes figurões históricos. Uma característica, talvez um pouco extremista, é de que no livro, assim como nos regimes totalitários, o poder cultiva a revolta em algumas pessoas para mostrar quem, afinal, exerce o poder. Winston foi, seguramente, instigado a se rebelar e viver um drama de final trágico. Dentro do livro a história e o passado são de domínio do Partido, que molda o passado para se acomodar no presente e manter, invariavelmente, as forças de poder no poder.

Baralha a ordem do tempo permitindo mudança do passado:

- O passado existe concretamente, no espaço? Existe em alguma parte um mundo de objetos sólidos, onde o passado ainda acontece?
-Não.
-Então, onde é que existe o passado, se é que ele existe?
-Nos registros. Está escrito.
-Nos registros. E em que mais?
-Na memória. Na memória dos homens.
-Na memória. Muito bem. Nós, o Partido, controlamos todos os registris, e controlamos todas as memórias. Nesse caso, controlamos o passado, não é verdade?
-Mas como podes impedir que a gente se lembre das coisas?!! É involuntário. Está fora do indivíduo. Como podes controlar a memória? Não controlaste a minha.


E assim Orwell demonstra como se é possível controlar a história, controlar o passado, mudar o passado e “baralhar” a ordem do tempo. Todo o tipo de registro que não interessava ao poder era por vezes eliminado, por outras moldado (ou mudado). Frequentemente mudavam várias vezes de acordo com a conveniência. Mas será que o monopólio da história é privilégio do futuro? Um absurdo deste acontece no nosso presente? É necessário tecnologia para controlar a história? Um contemporâneo de Orwell se questionou quanto a isto exatamente uma década antes. O dramaturgo Bertold Brecht escreveu de forma maestral um poema chamado Perguntas de Um trabalhador que lê no qual busca a compreensão do domínio da história por quem detém o poder. Vamos ler a obra abaixo.

PERGUNTAS DE UM TRABALHADOR QUE LÊ
Bertold Brecht


Quem construiu a Tebas de sete portas?
Nos livros estão nomes de reis.
Arrastaram eles os blocos de pedra?
E a Babilônia várias vezes destruída
Quem a reconstruiu tantas vezes? Em que casas
Da Lima dourada moravam os construtores?
Para onde foram os pedreiros, na noite em que
a Muralha da China ficou pronta?
A grande Roma está cheia de arcos do triunfo
Quem os ergueu? Sobre quem
triunfaram os Césares? A decantada Bizâncio
tinha somente palácios para os seus habitantes? Mesmo
na lendária Atlântida
os que se afogavam gritaram por seus escravos
na noite em que o mar a tragou.
O jovem Alexandre conquistou a Índia.
Sozinho?
César bateu os gauleses.
Não levava sequer um cozinheiro?
Filipe da Espanha chorou, quando sua armada
naufragou. Ninguém mais chorou?
Frederico II venceu a Guerra dos Sete Anos.
Quem venceu além dele?

Cada página uma vitória.
Quem cozinhava o banquete?
A cada dez anos um grande Homem.
Quem pagava a conta?

Tantas histórias.
Tantas questões.